O Repente, ou Cantoria, é uma das principais vertentes da poesia caracterizada pelo uso de rima e métrica. Chegou ao seu apogeu se aperfeiçoou ao longo de décadas no Nordeste, hoje conta com mais de 30 estilos poéticos e se caracteriza por genuína brasilidade.
ANTECEDENTES
Segundo o grande pesquisador e folclorista Luís da Câmara Cascudo, o desafio dos repentistas do Nordeste descende diretamente do Canto Amebeu (dos pastores da Grécia Antiga). Tal hipótese carece de estudos historiográficos que a comprovem.
Vários ensaios apontam para uma possível ligação entre a figura do Cantador do Nordeste brasileiro e a do Trovador da Provença, sul da França, do início do 2º milênio. O trovadorismo floresceu em Portugal, no século XII. Identificam-se também influências dos árabes do norte da África que colonizaram a Provença e a península ibérica.
A primeira forma de improvisar versos no Brasil é provavelmente a Glosa, que em várias regiões do Nordeste é compreendida como prática em que o poeta fala ou declama versos feitos na hora, obedecendo aos preceitos de rima, métrica e oração poética, em geral versos septissílabos, desenvolvidos a partir de um mote (leia sobre oração, métrica e rima nesse outro artigo).
Um dos primeiros grandes glosadores brasileiros foi Gregório de Matos e Guerra (Salvador, 1636-1695). Não se sabe ao certo quanto tempo ele levava para o desenvolvimento de suas glosas, mas é fato a ampla repercussão que tomou sua produção poética.
A CANTORIA (OU REPENTE)
A arte hoje conhecida como Cantoria ou Repente teve origem na segunda metade do século XIX, na Serra do Teixeira, sertão da Paraíba, região onde os primeiros repentistas começaram a travar desafios de repentes. A maioria desses primeiros repentistas cultivava o hábito da leitura e da escrita e vivia da agricultura, comércio e outras atividades, sendo o resultado financeiro das cantorias uma renda complementar.
No início do século XX, o número de repentistas já era grande em vários estados do Nordeste. Estimativas mais recentes apontam para poucos milhares entre profissionais e amadores. Em 2010 foi sancionada a Lei que estabelece a profissão de repentista.
Na configuração que tomou durante o século XX, a Arte do Repente se caracteriza pela ação dos cantadores que, em dupla, tocam violas com afinação regra inteira ou nordestina e cantam alternadamente estrofes rimadas compostas no momento da apresentação. Os repentistas utilizam estruturas pré-definidas com relação à métrica e melodias pré-existentes, as toadas, que são compartilhadas por esses artistas e, em muitos casos, se desconhece a autoria das mesmas.
Ressalto que a remuneração desses artistas sempre fez parte do rito das cantorias, fosse ela como retribuição espontânea ao atendimento de um tema e boa abordagem, como compra de ingresso ou como cachê acordado com o organizador do evento.
Existem mais de 30 modalidades de Repente. De acordo com a modalidade, os versos podem ser de 4, 5, 7, 10 ou 11 sílabas rítmicas e as estrofes, em maioria, são compostas por 6, 7, 8 ou 10 versos cada. Em certas modalidades, alguns dos versos componentes das estrofes são pré-definidos, com os quais são rimados versos improvisados. Dentre as modalidades mais usadas estão:
Sextilhas (ouvir João Paraibano e João Lourenço);
Mote de Sete Sílabas (assistir João Santana e Ismael Pereira);
Mote Decassílabo (ouvir Edmilson e Lisboa);
Martelo Agalopado (assistir Chico de Assis e João Santana);
Galope à Beira-Mar (assistir Chico de Assis e João Santana);
Mourão (assistir Chico de Assis e João Santana); e
Coqueiro da Bahia (assistir Chico de Assis e João Santana).
Diversos profissionais do Repente atualmente participam de inúmeros festivais, apresentações e cantorias de pé-de-parede no Nordeste e outras regiões do País, têm CDs e DVDs gravados e vêm agradando às plateias dessa Arte, alguns com turnês internacionais.
Dentre estes figuram os seguintes cantadores e respectivos estados de origem (a seguir estão listados apenas alguns dos repentistas de destaque que hoje mantém a Arte do Repente viva, peço compreensão caso falte algum nome importante, que você poderá mencionar nos comentários):
Ivanildo Vila Nova (PE)
Oliveira de Panelas (PE)
Geraldo Amâncio (CE)
Antônio Lisboa (RN)
Edmilson Ferreira (PI)
Raimundo Caetano (PB)
Rogério Meneses (PB)
Hipólito Moura (PI)
Raullino Silva (RN)
Jonas Bezerra (CE)
Ismael Pereira (CE)
Valdir Teles (PB)
Sebastião Dias (RN)
Sebastião da Silva (PB)
Moacir Laurentino (PB)
Zé Cardoso (RN)
João Lourenço (PB)
Zé Viola (PI)
Severino Feitosa (PB)
Chico Alves (CE)
Sílvio Granjeiro (CE)
Edezel Pereira (PB)
Biu Dionízio (PB)
Geraldo Alves (PB)
Acrízio de França (PB)
Edvaldo Zuzu (PB)
Zé Galdino (PB)
Antônio Raimundo (PI)
Jomaci Dantas (PB)
João Lídio (PE)
José Carlos do Pajeú (PE)
Luciano Leonel (PE)
Paulo Pereira (CE)
Genaldo Pereira (CE)
Jairo Silva (PI)
Jeferson Silva (PI)
Felipe Pereira (RN)
Helânio Moreira (RN)
Chico de Assis (RN)
João Santana (DF)
Dois repentistas não citados acima, que fizeram história na Cantoria, são Raimundo Nonato (PB) e Nonato Costa (CE). Hoje eles são compositores e cantores, cada qual com sua banda e sua agenda, após anos de fama da dupla, Os Nonatos, cujas canções fizeram história.
Aproveite para baixar o folheto de cordel eletrônico A Origem do Repente!
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Um abraço,
João Santana
Esqueceram de citar o nome do maior e imbatível Manuel Xudu de São José dos Ramos – PB.
Importante colaboração a uma cultura que, embora centenária, não tem sido devidamente valorizada e divulgada.
Posso emitir tal opinião com conhecimento de causa. Meu pai foi um repentista paraibano, natural de Catolé do Rocha, que se estabeleceu na região do Seridó,como pioneiro em radiodifusão, com um programa fundado em 1963, ainda no ar, na Rádio Rural de Caicó, RN, mesmo após seu falecimento em 2011.
Chico Motta, como é conhecido, mesmo não sendo um dos maiores em genialidade ou popularidade, foi um cantador bastante atuante e conhecido na região.
De pouco estudo formal, autodidata, também agricultor no início, fez uma longa carreira como violeiro, cantador de viola, poeta repentista, fazendo dupla com, e mantendo em seu círculo os tradicionais cantores mais antigos e grandes nomes da atualidade.
Seu maior mérito, sem dúvida, foi, através de seu programa, difundir a cantoria, levá-la
aos rincões, tanto através da participação maciça dos grandes da cantoria, como da apresentação de novos talentos. Foi mérito seu, também, tornar conhecida a cantoria no meio urbano, antes mais presente no meio rural. É relevante ainda um fator crucial, manter-se e sobreviver exclusivamente da profissão, a despeito da grande família que constituiu e conseguiu criar e educar às expensas, unicamente de sua arte. A batalha homérica pela sobrevivência, sem dúvida, foi um dos entraves para o seu crescimento continuado, visto que faltavam as condições mínimas necessárias ao estudo e aperfeiçoamento.
Contudo, foi um vencedor, apesar de todas as adversidades, sejam as motivadas pela falta de reconhecimento dessa cultura popular ou as de limitação intrínseca à sua condição pessoal.
Haverá ainda de continuar figurando entre os repentistas que fizeram história.
Chico Motta – in memoriam (1925-2011)
Olá, Maria de Fàtima!
Muito obrigado por seu relato! Ouvi falar de seu pai no meio da Cantoria. Ele deixou sua marca!
Um abraço!
Olá, Marcone,
Obrigado por lembrar do grande Xudu.
Aqui estão citados alguns nomes da atualidade, que estão, ou estavam vivos até 2016.
Um abraço!
preciso de contatos de repentistas meu zap 064 984043000